Capítulo 1 - O Peso da Força

O sol da manhã já estava alto, iluminando os vastos campos do vibrante distrito Offspring, onde se localizava a Academia Heisenberg, uma das escolas mais prestigiadas da região. Ao redor, montanhas cobertas por florestas temperadas se erguiam, e o fim do verão já se fazia presente, com as folhas coloridas caindo lentamente no chão.
Era seu primeiro dia no ensino médio, e ele sentia a confiança pulsando nas veias. Com os ombros erguidos e o peito inflado, subia as escadas do imponente prédio da academia. Seus passos firmes ecoavam enquanto passava pelos novos colegas. Tinha olhos marcantes, cabelo liso e castanho, além de ser mais alto do que a média.
Ele sempre soubera que era especial. Desde pequeno, sua força era algo fora do comum. Sua habilidade de manipular a magia Falí o destacava de qualquer um que conhecia. Enquanto seus colegas lutavam para dominar pequenos truques ou habilidades físicas comuns, ele já havia superado todos de sua idade. Acreditava, com convicção, que ninguém seria capaz de desafiar sua supremacia na nova escola.
Ao passar pelos portões da academia, sentiu os olhares curiosos e admirados dos outros estudantes. Suas roupas, impecavelmente ajustadas, consistiam em uma camisa azul-marinho e calça preta, refletindo a imagem de alguém que sabia o que queria e estava preparado para alcançar seus objetivos. Aquele lugar era apenas mais uma etapa. Ele não estava ali para aprender; estava ali para mostrar sua superioridade.
— É aqui que vai começar o meu verdadeiro reinado — murmurou para si mesmo enquanto atravessava o pátio. Seus olhos percorriam o local à procura de algo ou alguém que pudesse tornar interessante seu primeiro dia.
Antes que pudesse explorar mais, o sino tocou, indicando que era hora da primeira aula. Ele seguiu em direção à sala designada, onde seria orientado por uma professora recém-admitida. Ayla era conhecida por sua paciência e habilidade em desenvolver o potencial de qualquer aluno, mas ele duvidava que ela tivesse algo a lhe ensinar. Já dominava o que a academia oferecia — ou, pelo menos, era isso que pensava.
Ao entrar na sala, procurou seu assento no centro, mantendo uma postura de despreocupação. Observou os outros estudantes cochichando entre si, até que uma presença serena e firme tomou conta da sala. Ayla entrou.
Ela era uma figura graciosa, com longos cabelos ruivos que pareciam brilhar sob a luz do sol que entrava pela janela. Seus olhos alaranjados varriam a sala com um olhar calmo, mas atento. Ao contrário de muitos professores que usavam de autoridade para impor respeito, ela exalava tranquilidade. No entanto, havia algo em sua postura que mostrava que não tolerava arrogância.
— Bom dia, classe — disse Ayla, com a voz suave, mas firme. — Hoje começamos uma nova jornada, e espero que todos estejam dispostos a aprender. Não apenas a manipular Falí, mas a entender a responsabilidade que vem com o poder — terminou.
Ele bufou, quase inaudível, mas o suficiente para que ela percebesse.
— Algo a acrescentar, Alex Voltaire? — Ela o encarou, com uma leve arqueada de sobrancelha. A sala ficou em silêncio.
Ele sorriu com superioridade, sem se surpreender de ela já saber seu nome.
— Só acho que alguns de nós já dominamos essas coisas. Eu, por exemplo, não estou aqui para aprender o que já sei.
Ayla manteve o olhar fixo em Alex por um momento. Então, com um pequeno gesto, apontou para o quadro ao lado.
— Se já domina, venha aqui e me mostre.
Alex levantou-se com confiança. "Finalmente, uma oportunidade de mostrar do que sou capaz", pensou. Todos os olhos estavam nele enquanto caminhava até a frente da sala. Ele ergueu a mão e começou a concentrar sua energia, formando uma esfera de luz azul-claro brilhante e pulsante entre os dedos. Um espetáculo de poder bruto.
Por um momento, parecia que ele impressionaria a todos. A esfera crescia, a energia vibrando ao redor, mas, de repente, começou a se desestabilizar. A luz que antes era controlada, oscilava, ameaçando explodir.
Antes que pudesse reagir, Ayla deu um simples passo à frente e, com um gesto quase imperceptível, desfez a esfera de energia com facilidade. A classe ficou atônita. Alex olhou para suas mãos, incrédulo, enquanto o poder que ele havia convocado se dissipava.
— O controle da energia — disse Ayla, com calma — não se trata apenas de força bruta. A verdadeira maestria está no equilíbrio, na paciência. Você pode ter muito poder, Alex, mas, sem controle e humildade, ele é inútil.
A raiva ferveu dentro de Alex enquanto voltava para seu lugar. Como poderia ser humilhado assim? Ele, que sempre se destacara, fora neutralizado com tanta facilidade. De repente, a porta se abriu abruptamente, e um garoto baixo, de cabelos escuros e bagunçados, entrou correndo, claramente atrasado.
— Desculpe o atraso, professora! — Disse o garoto, ofegante. Seu sorriso era despreocupado, quase encantador.
Ayla assentiu.
— Tudo bem, Milo. Encontre seu lugar.
Milo olhou ao redor e, sem hesitar, foi direto para o lado de Alex, ainda de pé, estendendo a mão como se o conhecesse há anos.
— E aí? Milo de Hermes — disse ele, de forma leve.
Alex olhou para a mão estendida e, relutante, apertou-a.
— Alex — respondeu com um suspiro.
Milo sorriu.
— Você parece ser o tipo de cara que sabe o que está fazendo. Talvez possamos aprender uma ou duas coisas um com o outro.
Apesar de sua frustração com o que acabara de acontecer, algo na atitude relaxada e amigável de Milo fez Alex baixar um pouco a guarda. Talvez, pela primeira vez, ele sentisse que poderia realmente estar diante de alguém que não o via apenas pelo seu poder.
Ainda assim, ele não podia deixar de se sentir incomodado. Ayla havia colocado um espelho diante dele — um reflexo de sua arrogância. E, por mais que odiasse admitir, sabia que havia algo de verdade nas palavras dela.
Nos dias seguintes, Alex tentou se ajustar à nova realidade da Academia Heisenberg, mas a humilhação que Ayla lhe causara continuava a ferver em sua mente. Ele ainda acreditava ser superior, mas as palavras da professora ecoavam: "Sem controle e humildade, seu poder é inútil." Cada vez que treinava, isso o fazia perder a concentração.
No entanto, Milo, com sua personalidade leve, parecia não se importar com o peso da seriedade que Alex carregava. Ele o seguia por todos os lados, oferecendo uma conversa aqui e ali, sempre com um sorriso fácil. Alex não sabia como reagir; nunca tinha feito amizade de verdade com ninguém. As pessoas geralmente se aproximavam por medo ou admiração de suas habilidades, mas Milo era diferente; ele não via Alex apenas como um prodígio arrogante, mas como uma oportunidade de parceria, e talvez até amizade.
No quinto dia de aula, depois de uma sessão particularmente frustrante de treino, Alex jogou-se no gramado do pátio da academia. Estava exausto, não apenas fisicamente, mas mentalmente. Ayla havia dado mais uma aula sobre controle e equilíbrio, e ele se sentia como se estivesse sendo constantemente testado. Ao seu lado, Milo apareceu, como sempre, com um sorriso relaxado.
— Você parece exausto, cara — disse Milo, sentando-se ao lado dele. — Ayla está pegando pesado com você, hein?
Alex bufou.
— Ela está me tratando como se eu fosse um novato que não sabe o que está fazendo.
Milo deu uma risada curta.
— Talvez seja isso que você precise.
Alex olhou para ele com desdém.
— Do que você está falando? Eu sei exatamente o que estou fazendo.
Milo sacudiu a cabeça.
— Cara, não é uma questão de força ou de mostrar o quanto você é forte. Ayla... ela está tentando te ensinar algo que vai além disso — Milo mostrou um olhar sério. — Eu era parecido. Sempre confiando no que já sabia, achando que tinha tudo sob controle. Mas ela tem uma maneira de fazer a gente perceber que sempre há algo mais profundo.
Alex ficou em silêncio, observando as folhas balançando ao vento, como se estivesse à procura de uma resposta entre elas. Ele sabia que Milo estava certo, mas admitir isso era um golpe em seu orgulho.
— Ela está me subestimando — disse Alex, depois de um momento.
Milo deu de ombros.
— Talvez. Ou talvez ela esteja tentando te empurrar para algo maior do que você mesmo. O que você acha que ela faz com os outros alunos?
Alex ponderou por um momento. Sempre se concentrou tanto em si mesmo que mal notava os outros ao seu redor. Para ele, os outros alunos eram apenas admiradores ou, no mínimo, espectadores. Mas Ayla dedicava tempo a todos. Mesmo aqueles sem habilidades impressionantes. Ela sempre os tratava com o mesmo respeito e paciência.
— Ela... é justa com todos — falou Alex, um pouco surpreso ao ouvir suas próprias palavras.
Milo sorriu, satisfeito.
— Exatamente. E é isso que a torna tão boa no que faz.
Os dois ficaram em silêncio por um tempo, até que Milo começou a falar sobre coisas triviais, puxando Alex para longe de seus pensamentos profundos. Ele contou histórias sobre sua família, sobre a vida antes da academia e até algumas situações embaraçosas que já havia enfrentado por sua insegurança. Alex riu, sem perceber que, aos poucos, começava a baixar a guarda.
Na semana seguinte, era dia de treino prático. Alguns alunos faziam cara de desgosto ou preocupação enquanto Ayla reunia todos no campo de treinamento. Era uma sessão de combate simulado. Alex, que passara o fim de semana refletindo sobre o que ocorrera nos últimos dias, estava pronto para mostrar que sua força ainda era inigualável. Ele encarou Ayla, esperando que ela o desafiasse de novo, mas, desta vez, provaria seu valor. No entanto, para sua surpresa, ela o colocou para treinar com Milo.
— Vocês dois têm algo a aprender um com o outro — disse Ayla, calmamente. — Alex, você precisa aprender seu verdadeiro poder dentro de si mesmo. Milo, você deve ser mais ousado e assertivo. Vamos ver o que podem fazer juntos.
Alex franziu a testa, claramente descontente. Ele estava esperando por um desafio mais significativo, algo que pudesse mostrar a Ayla que não precisava de mais lições sobre humildade. Mas Milo, sempre descontraído, apenas sorriu e estendeu a mão.
— Vamos lá, parceiro. Talvez a gente se surpreenda.
O treinamento começou de forma simples, com os dois trocando golpes de energia e técnicas de defesa. Alex atacava com força, mas sua falta de controle e paciência se mostrava um obstáculo. Por outro lado, Milo era ágil, desviando dos ataques, mesmo que com dificuldades, e sem confiança para contra-atacar. Mesmo assim, havia um equilíbrio quase cômico: Alex era forte demais, e Milo, cuidadoso demais.
— Você precisa ser mais ousado! — gritou Alex, enquanto lançava uma onda de energia em direção a Milo.
— E você precisa parar de querer explodir tudo! — retrucou Milo, desesperado enquanto se esquivava.
Ayla observava de perto, ocasionalmente oferecendo conselhos, mas deixando que os dois se ajustassem um ao outro. Conforme a batalha prosseguia, algo mudava. Alex, sem perceber, começou a equilibrar sua força. Não era só sobre vencer. Ele percebeu que precisava sentir o ritmo de Milo, ajustar seus ataques para fazê-lo se soltar, se limitar para deixar a luta mais interessante e aprender o básico. E Milo, inspirado pela intensidade de Alex, atacava com mais confiança.
No fim da sessão, os dois estavam ofegantes, mas sorrindo. Ayla caminhou até eles, uma expressão de leve satisfação em seu rosto.
— Vocês dois fizeram progressos hoje. Alex, estou vendo que você está aprendendo a conter sua força e usar com mais precisão. E Milo, continue sendo ousado.
Alex olhou para Milo, que sorriu em resposta. Havia algo diferente naquela interação. Pela primeira vez, Alex sentiu que havia realmente aprendido algo novo. Não sobre poder, mas sobre si mesmo.
Mais tarde, a noite caiu sobre a academia. Alex foi para seu dormitório, passando pelo caminho que contornava um parque, ainda processando o dia. Olhou para suas mãos, lembrando-se da sensação de conter seu poder, de trabalhar em harmonia com Milo e das palavras de Ayla.
De repente, sentiu uma presença ao seu lado. Era Ayla, caminhando silenciosamente.
— Você está pensando no treino de hoje, não é? — perguntou ela, inclinando o corpo para frente e colocando as mãos para trás, sem preâmbulos.
— Acho que comecei a entender o que você estava tentando me ensinar — Alex assentiu.
Ayla parou de caminhar e olhou para ele com seus olhos profundos e sábios.
— O poder, Alex, não é uma bênção. É um fardo. Você precisa aprender a carregá-lo com responsabilidade. Isso requer controle, paciência e, acima de tudo, humildade. Quanto mais cedo você entender isso, mais longe irá.
Alex olhou para o chão, refletindo sobre suas palavras. Pela primeira vez, estava disposto a ouvir.
— Eu não sou tão forte quanto achava, não é?
— Você é forte, Alex — Ayla sorriu gentilmente. — Mas força sem controle é como usar uma espada sem empunhadura. Agora, descanse. Amanhã será um novo dia de aprendizado.
Conforme Ayla se afastava, Alex ficou parado por alguns instantes, olhando para o horizonte. Pela primeira vez, sentiu que havia mais a aprender do que imaginava. E, de alguma forma, isso o empolgava. Talvez, com Ayla como guia e Milo como amigo, ele pudesse se tornar algo mais do que apenas o melhor conjurador. Ele poderia alcançar todo o seu potencial.
Com esses pensamentos em mente, Alex, já no dormitório, estava determinado a enfrentar o próximo dia com uma nova perspectiva. O peso da força não estava apenas em quanto poder ele podia exercer, mas em como ele usaria esse poder para o bem dos outros.
No fundo, sabia que um novo caminho estava se abrindo, um caminho que o desafiaria mais do que qualquer batalha. E esse era apenas o começo.